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Método Qualitativo e Quantitativo na Segurança do Trabalho, quando Utilizar?



A atual discussão sobre as vantagens e desvantagens dos diversos métodos de pesquisa social desenvolvidos na área da saúde requer um exame muito atento acerca de alguns problemas relacionados à integração entre as perspectivas qualitativa e quantitativa. O debate e a contraposição freqüentemente registrada entre as duas abordagens não são novos, nem exclusivos do campo das ciências sociais aplicadas à saúde. A discussão vem se desenvolvendo desde a fundação das ciências sociais, e precisamente desde a análise durkheimiana do suicídio.

As correntes positivistas e neopositivistas definem como científicas somente as pesquisas baseadas na observação de dados da experiência e que utilizam instrumentos de mensuração sofisticados. Por isso, afirmam que os métodos qualitativos não originam resultados confiáveis. Por outra parte, os teóricos qualitativistas sustentam que os quantitativistas, na medida que não se colocam no lugar do sujeito, não realizam investigações válidas.

Quando utilizar a análise qualitativa ou a quantitativa

Uma vez que se aceite a complementaridade entre as duas abordagens e a forma de propor alguma integração, a partir do reconhecimento das especificidades de cada uma, é possível identificar de que maneira podem ser mais bem incorporadas ao desenho da pesquisa.

Se o objeto de estudo está bem definido, já que outras pesquisas têm acumulado um corpo suficiente de conhecimentos sobre o tema, trata-se então de verificar somente se este corpo de conhecimentos vale em outras situações, ainda não exploradas empiricamente. Neste caso podem-se utilizar métodos de pesquisa quantitativa como um questionário estruturado ou uma sondagem.

Porém, existem áreas de interesse em que não se tem ainda desenvolvido um adequado conhecimento teórico e conceitual, ou não foram formuladas hipóteses precisas ou ainda não sabemos com clareza o que estamos buscando. Nesses casos, os métodos qualitativos ajudam no trabalho de construção do objeto estudado, facilitam na descoberta de dimensões não conhecidas do problema e permitem também formular e comprovar novas hipóteses.

Os métodos qualitativos devem ser utilizados quando o objeto de estudo não é bem conhecido. Por sua capacidade de fazer emergir aspectos novos, de ir ao fundo do significado e de estar na perspectiva do sujeito, são aptos para descobrir novos nexos e explicar significados. De fato, durante a pesquisa, freqüentemente emergem relações entre variáveis, motivações e comportamentos completamente inesperados, que não surgiriam utilizando um questionário estruturado, cuja característica técnica é a uniformidade do estímulo.

Por isso, os métodos qualitativos são muito importantes na fase preliminar da pesquisa. Segundo Ferrarotti (1999), não há nenhuma dúvida de que as técnicas de validação (context of validation) sejam importantes, mas em todo caso o contexto do descobrimento (context of discovery) chega antes.

Cabe destacar, porém, que a fase preliminar pode ser legitimamente considerada o ponto de chegada da pesquisa (Cavalli, 1996). Em outras palavras, a análise qualitativa pode também não chegar a quantificar e, por outra parte, nada exclui que a análise quantitativa implique a necessidade de novas análises qualitativas. A contraposição entre qualidade e quantidade torna-se, portanto, matizada, e a integração, inevitável.

Características dos métodos qualitativos e quantitativos

Uma vez resolvido o conflito entre métodos qualitativos e quantitativos, evidenciando a complementaridade entre eles e a possibilidade de encaminhar estratégias de integração na prática da investigação, é preciso identificar as características e as especificidades de cada abordagem. A este respeito é interessante utilizar a tipologia elaborada por Reichardt & Cook (1979) que, depois de terem declarado seus objetivos de superar a contraposição entre métodos qualitativos e quantitativos - no trabalho Beyond qualitative versus quantitative method -, listam as diferentes características das duas perspectivas.

Métodos qualitativos: fenomenologia e compreensão

• analisam o comportamento humano, do ponto de vista do ator, utilizando a observação naturalista e não controlada;

• são subjetivos e estão perto dos dados (perspectiva de dentro, insider), orientados ao descobrimento;

• são exploratórios, descritivos e indutivos;

• são orientados ao processo e assumem uma realidade dinâmica;

• são holísticos e não generalizáveis.

Métodos quantitativos: positivismo lógico

• são orientados à busca da magnitude e das causas dos fenômenos sociais, sem interesse pela dimensão subjetiva e utilizam procedimentos controlados;

• são objetivos e distantes dos dados (perspectiva externa, outsider), orientados à verificação e são hipotético-dedutivos;

• assumem uma realidade estática;

• são orientados aos resultados, são replicáveis e generalizáveis.

Conclusão

À guisa de conclusão deste trabalho, cujo objetivo é contribuir para a superação da incomunicabilidade entre pesquisadores qualitativos e quantitativos, faz-se necessário chamar a atenção sobre dois preconceitos que têm caracterizado o debate a respeito destes dois métodos.

O primeiro aspecto a ser analisado e superado na dialética qualitativo-quantitativo é a questão da sensibilidade, geralmente atribuída aos pesquisadores qualitativos. Cabe assinalar, conforme explicita Cavalli (1996), que a particular sensibilidade do pesquisador ou aquela que ele chama a penetração empática não é um método, mas uma capacidade subjetiva que tem que ser rigorosamente distinta do método compreensivo. Em outras palavras, os métodos qualitativos não estão relacionados à sensibilidade e intuição do pesquisador. A sensibilidade é um atributo necessário e desejável em todos os tipos de pesquisa social.

Por outro lado, há que se superar também outro preconceito que atribui maior cientificidade à abordagem quantitativa. Em verdade, os métodos qualitativos são tão rigorosos quanto os quantitativos. Qualquer método requer um conjunto de regras e procedimentos, que permitem controlar os componentes subjetivos da interpretação (Cavalli, 1996). Do ponto de vista epistemológico, sublinham Minayo & Sanches (1993), nenhuma das duas abordagens é mais científica do que a outra (...) Uma pesquisa, por ser quantitativa, não se torna objetiva e melhor. Enfim, trata-se de duas abordagens com características bem distintas, mas ambas dentro do mesmo método científico.

Para finalizar é interessante utilizar a metáfora do honesto e humilde artesão, que Cardano tem elaborado para superar, com criatividade e eficácia, o dilema metodológico (qualitativo-quantitativo) que sempre angustiou aos pesquisadores sociais. Nas palavras de Cardano (1991), os pesquisadores de tradição quantitativa parecem inspirar-se na produção em série (...) mostrando como os procedimentos adotados se inscrevem em um modelo científico uniforme e amplamente compartilhado (...) Por outro lado, na pesquisa qualitativa prevalece um modelo de argumentação que parece inspirar-se na produção artística. Aqui se propõe um percurso alternativo, que, às figuras míticas do artista solitário e de produção em série, se substitui a produção mais modesta do artesão.

Autor:Mauro Serapioni

Fonte: Métodos qualitativos e quantitativos na pesquisa social em saúde: algumas estratégias para a integração, http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232000000100016

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